sábado, 15 de agosto de 2015

QE 40: a quadra mais violenta do DF

Levantamento da Secretaria de Segurança indicam que as duas quadras são as de maior incidência de crimes no DF no primeiro semestre


O adensamento populacional do Polo de Moda e QE 40 sem planejamento é uma das principais causas da violência. Sem estacionamentos, os carros ficam nas ruas, e os baixos preços dos aluguéis são um chamariz para os criminosos

A mistura de omissão da fiscalização, ganância da especulação imobiliária e  crise econômica está transformando a QE 40 e o Polo de Moda numa das três localidades mais violentas do Distrito Federal. As duas quadras - que na verdade é uma só, porque o Polo também é QE 40 – foram incluídas no mapa das três regiões mais inseguras do Distrito Federal, de acordo com dados divulgados esta semana pela Secretaria de Segurança Pública e Paz Social. Mais até do que as históricas Ceilândia e Samambaia, até então consideradas as mais perigosas do DF.

Com o levantamento de todas as ocorrências policiais em mãos, a Secretaria mapeou as “manchas criminais” do DF, aquelas onde mais ocorrem crimes de qualquer natureza. Além das duas quadras do Guará, as proximidades da Rodoviária do Plano Piloto e Setor Comercial Sul, e o Cruzeiro completam o quadro do medo.
O pior é que a QE 40 (incluindo o Polo de Moda) consegue ser a mais insegura delas. De acordo com o levantamento de todos os crimes do primeiro semestre, foram registrados 81 furtos em veículos, 35 carros roubados e 27 assaltos a pedestres, ou 338 ocorrências policiais,  o que representa 18% de todos os delitos praticados no Guará no mesmo período.

O estudo vai servir para a Secretaria redistribuir seus efetivos policiais e concentrar reforços da segurança nas áreas mais críticas. De acordo com o levantamento, a maior parte dos crimes acontece durante o dia, quando é maior a concentração de pessoas na rua e a segurança fica mais vulnerável.
A explicação para o aumento da violência na QE 40 está no desvirtuamento dos objetivos da quadra, criada para ser um polo de desenvolvimento, mas transformada ao longo do tempo em “polo de quitinete”.  Os lotes, que deveriam ter sido ocupados por algum tipo de atividade econômica e no máximo a família dos seus proprietários em mais dois pavimentos, foram transformados na maioria em edifícios residenciais com até seis pavimentos, abrigando até 20 quitinetes.

Como são irregularidades e pequenas, as quitinetes atraem o inquilino de menor poder aquisitivo e, pior, sem necessidade de comprovação de antecedentes criminais ou de cadastro.  “É pra lá que vão as pessoas que não conseguem alugar em outro lugar por causa das exigências de documentos ou de ficha limpa, ou que pretendem ficar por pouco tempo em um lugar enquanto praticam crimes”,  teoriza o delegado chefe da 4ª Delegacia de Polícia do Guará, Rodrigo Larizzatti. Essas facilidades, principalmente por causa do tamanho dos imóveis,  tem atraído também garotas de programa, de acordo com a quantidade de  anúncios publicados na Internet e nos classificados do  Correio Braziliense.

Contribuiu para esse desvirtuamento, a omissão do governo, em parte consentida ou acobertada pela Agência de Fiscalização (Agefis), acusada de fechar os olhos para as irregularidades em troca de  pagamento de propina,  e por falta de vontade política do governo  de enfrentar o problema.
Polo de quitinete

Criado para ser um centro de desenvolvimento econômico, a QE 40 e depois o  Polo de Moda deveriam abranger toda a cadeia industrial de vestuário, mas foi tomado por residências e por comércios de todos os segmentos. De acordo com levantamento  da Associação do Polo de Moda, há 239 empresas ligadas ao setor de vestuário atuando no local com a venda de matéria-prima, confecção e comercialização de roupas, quando deveria existir pelo menos o dobro. “Muitas fábricas menores acabaram ficando apenas com a parte térrea do prédio e os andares de cima viraram residenciais”, explica a presidente da Associação, Najla Maria Gonçalves.

Por meio do Pró-DF, programa de fomento à indústria do governo do Distrito Federal, centenas de costureiros e empresários receberam lotes no setor por 10% do valor original de mercado. Muitos dos que foram contemplados com os terrenos, no entanto, não tiveram condições de pagar pela edificação dos prédios ou de gerar os empregos previstos no acordo de concessão dos lotes.

A  dificuldade em manter um negócio no local fez com que muitos contemplados vendessem e alugassem parte dos terrenos. “Na hora de direcionar os lotes, deram para confecções muito pequenas, confecções que não conseguiram subir o prédio, construir”, explica  empresária Andréa Monteiro. “Então, [os beneficiários] construíram uma fábrica embaixo e venderam a parte de cima. Atualmente, muitas empresas, confecções pequenas que ainda são efetivas, estão em apuros porque quem vendeu os apartamentos não tinha os documentos.

A empresária e costureira América Rocha diz que chegou ao polo em 2001, beneficiada pelo programa. “Quando comecei, aqui não tinha nada. Eu era a única dessa rua, era tudo vazio, e comecei com muita dificuldade. As pessoas tinham muita dificuldade de arcar com a construção. Pegamos o terreno limpo, tinha o IPTU, pagamos a taxa de ocupação, que não foi tão barata assim, e os 10% do valor do lote. Tudo isso pesava.”

Somados aos custos de construção, a costureira tinha ainda que gerar cinco empregos. América Rocha diz que presta serviço para clientes antigas e para algumas lojas, mas afirma que raramente recebe clientes na porta. “Não há nenhum apoio ou incentivo do governo para impulsionar a economia no local”, diz. “Os lotes eram para indústria e confecções, mas hoje tem de tudo, virou quase um polo residencial. Confecção é o que menos tem. Acho que é por isso que enfraqueceu.”
A empresária Paula Luz trabalha há dez anos no setor vendendo uniformes profissionais e, ao contrário de muitos comerciantes, paga aluguel pelo espaço em que atua. “Comecei quando o Polo de Modas ainda era chão. Comecei do nada, vendendo uma ou duas camisetas, que dava para as pessoas fazerem para mim. Aí comprei máquinas e montei a confecção completa”, diz.

Muitos beneficiados pelo programa, segundo ela, simulavam o funcionamento de um comércio de confecção para ganhar o lote e atualmente vivem de aluguel. “Eles pegavam o lote e davam para um costureiro ficar dentro e costurar até sair o incentivo”, disse. “Era um polo de indústrias, mas, desde o início, não foi nada disso que aconteceu. Foi uma mentira. Tem lanche, tem mercado, tem moradia. Tem bastante confecção, mas é muito pouco para o que deveria ser. Um monte de gente vive de aluguel.”
Embora não receba clientes na porta da loja e acredite que estar inserida no polo não é o que atrai os negócios, Paula diz gostar do local por conta da localização, que permite chegar rapidamente aos clientes para fazer entregas. “Para mim é perfeito. Gosto daqui, não tenho do que reclamar. Pago aluguel, mas também não tinha condição de comprar na época. Agora tenho. E vou procurar.”

“O Polo de Moda existe, ele é efetivo, mas o governo meio que fecha os olhos para ele. Acontecem várias coisas aqui que não são a favor do polo, das próprias confecções. Da mesma forma que em Goiânia se vende muita roupa, poderíamos ter isso aqui. Por que tem que vir a Feira do Goiano para Brasília, sendo que tem produção aqui? O governo deveria valorizar isso. Aí preferem falar que não é um polo efetivo”, diz Andrea.















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